Gratidão significa, literalmente, dar graças ou agradecer o que se tem, ou seja, reconhecer tudo aquilo que há de bom na nossa vida e à nossa volta. E isso pode aplicar-se a coisas grandes e importantes – como ter alguma saúde, uma casa e pessoas que nos amam – mas também a coisas aparentemente mais pequenas – como uma gentileza de alguém, um dia bonito ou um bolo saboroso. No dia-a-dia temos tendência para não valorizar estas coisas, seja pelo hábito de as tomar por garantidas, seja pela aceleração em que vivemos. Mas continuar a lembrar e a agradecer estas pequenas ou grandes dádivas pode fazer uma gigante diferença na nossa qualidade de vida.

Quando, há mais de três décadas, foi iniciado o campo de estudo da psicologia positiva, começou a ser estudado o papel do perdão, da resiliência, do envelhecimento positivo, da autoestima e da meditação na procura da felicidade e bem-estar. Mas um dos conceitos mais estudados nos últimos anos tem sido o da gratidão, enquanto reconhecimento aos outros, à vida e a nós próprios, pelo que de bom temos e recebemos. A gratidão, revelam muitas investigações, está associada a emoções mais positivas, à capacidade de usufruir melhor das experiências, de melhorar a saúde, de lidar melhor com a adversidade e construir relacionamentos mais estáveis, logo, a um índice de felicidade maior.

Porque é que a gratidão faz bem?

  • Fortalece as emoções positivas e melhora o sono | Um dos estudos levados a cabo por Robert Emmons, um dos especialistas mundiais nesta área, sugere que prestar atenção, intencionalmente, às coisas boas da vida tem efeitos emocionais e interpessoais que resultam numa vida mais feliz, num sono com melhor qualidade e em emoções mais positivas.
  • Fomenta as relações interpessoais | Um estudo publicado na revista Emotion revela que expressar gratidão ‘alerta’ os outros para um potencial vínculo social de qualidade. Nesse caso, demostrar gratidão ao outro mostra uma valorização da relação que existe, o que estimula o florescimento do elo social. Em suma, demonstrar gratidão torna as pessoas mais próximas e aumenta as probabilidades de virem a ter uma boa relação.
  • Melhora a saúde e reduz a dor |Um estudo que examinou a correlação entre a gratidão e a saúde física concluiu que as pessoas que se sentem mais gratas têm melhores índices de saúde. Esta associação é mais forte em idosos do que em jovens adultos. Os idosos com níveis de gratidão mais elevados queixam-se menos de dores.
  • Melhora a autoestima | Um estudo publicado no Journal of Applied Sport Psychology, feito com atletas, mostra que maiores níveis de gratidão estão relacionados com uma melhor autoestima. Neste caso, a gratidão floresceu através de uma interação que estimulou a confiança afetiva entre os atletas e os seus treinadores. 


Quais são os obstáculos à gratidão?

Temos tendência a viver em piloto-automático, o que é importante para economizar recursos ao nosso cérebro sempre ocupado, mas pode ser penalizador quando o objetivo é treinarmos a capacidade de sermos gratos. Por outro lado, a nossa capacidade de adaptação inata, que é tão importante na altura de nos ajustarmos a realidades menos positivas, também acaba por nos atraiçoar: ao fazermos o mesmo em relação às coisas boas da vida, deixamos de as valorizar. 

A psicóloga clínica e autora Lisa Firestone, diretora de Investigação e Educação da Glendon Association, uma organização sem fins lucrativos que faz investigação em saúde mental, elenca num artigo da Psychology Today outros dois motivos para a dificuldade em sermos gratos.

Por um lado, por mais que digamos que queremos amor, reconhecimento e bondade, pode ser muito difícil aceitar cada um deles por uma variedade de razões inesperadas: amar, por exemplo, significa ser vulnerável, e ser generoso pode causar-nos tristeza com a situação dos outros. Por outro lado, ser grato no presente pode recordar-nos tudo o que nos faltou no passado, nomeadamente para aqueles que não tiveram infâncias felizes. Estarmos gratos à vida pode, nestes casos, acabar por provocar sentimentos de culpa, de vergonha ou de desmerecimento que nos fazem sentir mal, sobretudo para com os outros.   


Como podemos tornar-nos mais gratos?

Há vários hábitos que podem ajudar-nos a treinar o ‘músculo’ da gratidão. Sugerimos-lhe algumas das recomendações da Harvard Medical School e da Greater Good Science Center, da Universidade de Berkeley:

  1. Escreva cartas de agradecimento

    Experimente escrever cartas de agradecimento a quem o faz sentir bem ou teve um impacto positivo na sua vida. Pode ser um amigo, um familiar, ex-colega ou professor. Idealmente a carta deve ser lida presencialmente, mas se não for possível também fazê-lo por telefone, por exemplo. Crie o hábito de enviar pelo menos uma carta de gratidão por mês e, ocasionalmente, escreva uma a si mesmo.

  2. Mantenha um diário de gratidão

    É importante criar um registo físico das coisas pelas quais nos sentimos gratos. Crie o hábito de anotar todos os dias, durante pelo menos uma semana, três coisas pelas quais se sente grato nesse dia. Podem ser coisas importantes ou pequenas, mas deve anotá-las com o máximo detalhe possível: anote exatamente o que aconteceu, incluindo o que fez ou disse, se outros estiveram envolvidos, o que fizeram ou disseram. Descreva a forma como se sentiu na altura e como se sente agora, ao recordá-lo.

  3. Subtraia mentalmente eventos positivos

    Uma vez por semana faça o seguinte exercício: pense num acontecimento importante na sua vida – como o seu curso/formação profissional, um trabalho que teve, o nascimento de um filho, uma viagem – e considere as circunstâncias que o tornaram possível. Depois considere situações que podiam ter levado a que esse evento não tivesse acontecido e anote-as. Imagine como seria sua vida atualmente se não tivesse tido oportunidade de viver essa experiência. Por fim, mude o seu foco para o presente, relembrado que o evento aconteceu e reflita sobre os benefícios que ele lhe trouxe. Permita-se sentir gratidão por tudo ter acontecido como aconteceu.

  4. Treine a atenção plena ou mindfulness

    Durante uma semana, reserve 20 minutos por dia para passear. Enquanto anda, tente perceber todas as coisas positivas que encontra à sua volta: pode ser o que vê, sons, cheiros ou outras sensações. Repare, por exemplo, numa árvore alta que nunca tinha visto antes, numa bonita fachada de um prédio, no cheio da erva molhada ou das flores. O objetivo do exercício é conseguir centrar-se no presente e apreciar as pequenas coisas prazerosas que, por falta de tempo e de atenção, costumamos negligenciar.

URO/2017/0033/Ptco, MAI18